Indicação de Obra: A Cor e outros Contos Inomináveis (por Omar Zaldivar)
Atualizado: 7 de set. de 2021

Contos são excelente exercícios para treinar transmissão de eventos. Experimentar formatos pode nos levar a conclusões fantásticas de como excitar (uy) as emoções do leitor. Nesse livro, que reúne contos baseados na mitologia Lovecraftiana, Omar oferece a quem se propõe entregar-se à escuridão momentos de torpor, alucinação, vontade de falar em línguas estranhas e uma chance cósmica de ser felizmente louco.
Como a intenção é buscar obras escritas que inspirem formatos de enredo para ajudar no seu cotidiano de gamedev, comentarei algumas passagens que nos fazem refletir sobre as ferramentas que temos à mão:
1- A COR: o conto introdutório do compêndio. O autor puxa os fatos que envolvem um estranho fenômeno a partir de anotações investigativas.
Os tópicos possuem testemunha-local-data e são seguidos do relato. É interessante perceber que os tópicos enumerando as testemunhas servem como norte para a evolução do enredo que subitamente se suspende e deixa o leitor finalizar com sua imaginação (ou não, uma vez que somos acostumados a uma sequência evolutiva com base no que foi presenciado, do que é tido como resultado de uma investigação).
2- ENIGMA DA ESCURIDÃO: o jogo narrativo aqui se pauta no fator tempo. A ludicidade com que a temporalidade (ou atemporalidade) indica dois espaços movimenta o enredo. A narrativa se alterna entre um plano (o físico) e outro plano (onde Ricardo se encontra abduzido) revelando a assincronia temporal. O leitor deve fazer um exercício de guardar na memória o horário apresentado no tópico para perceber que o que o protagonista sofre não corresponde com exatidão ao tempo vivenciado por seus familiares preocupados. Narrativas com mundos paralelos podem ser trabalhadas em jogos cujo foco seja o psicológico. Afinal, o que poderia ser o tempo senão uma invenção superficialmente controladora?
3- NICTOFOBIA - a estrutura desse conto provoca uma incrível imersão. A velocidade é alcançada pelas frases curtas que representam a adrenalina do pavor vivenciado pela protagonista, uma enxurrada de pensamentos que faz com que o leitor, aquele que deveria ter controle sobre a leitura, leia o texto mais rapidamente, como se ele próprio estivesse apavorado.
4- VISLUMBRE DO FIM - talvez o meu preferido. O autor apresenta a língua da mitologia Lovecraftiana como um coral de fundo musical inaudível que acompanha todo o desenrolar apocalíptico que segue. Na verdade, descreve o despertar e possibilidade o começo do fim. A evolução de toda essa destruição nos leva a imaginar as frases dos tópicos cada vez mais próximas. E agora vamos falar sobre essas ferramentas no enredo de gamedev.
Sinestesia é uma figura de linguagem em que as sensações físicas se misturam a partir das interpretações do que é mostrado, seja verbal ou não verbal. No caso dos contos de Omar, é sinestésico o resultado quando o leitor, profundamente concentrado no ato de ler, cria empatia e vivencia o terror junto com os protagonistas, ficando curioso e sofrendo. Essa forma de escrever (cinematográfica) é uma característica de Omar, como se observa em seus jogos Horror Amarelo e Tíndalos, o que enriquece a experiência, pois o jogador, em algum momento, se torna a personagem, e não assume posição passiva diante do enredo.
Genial é o roteirista oferecer ao receptor da obra um novo ponto de vista que possa experimentar. Ao planejar seus roteiros, você, como gamedev, deve pensar em como o jogador pode se envolver na narrativa. Isso acontece muito em filmes e jogos, especialmente os de horror.
Nunca se esqueça, mais do que os fatos da viagem, a viagem deve ser marcante. A perda da personagem deve ser sentida, o modo como as informações são dispostas podem ser muito mais interessantes do que elas mesmas. Como produzir isso? Cortes de cena, escolha de música e sons, diálogos calculadamente construídos, a lapidação de sua obra que afete todos os sentidos do jogador.
Quer ler os demais contos do Omar?
https://www.wattpad.com/958275338-a-cor-e-outros-contos-inomin%C3%A1veis-introdu%C3%A7%C3%A3o
Quando ficar louco, poderemos nos ver por aí. Sanidade não faz parte do nosso rolê!
C ya.