"O poeta é um fingidor
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente"
Você deve lembrar da época em que estudava que alguma coisa era azul porque o eu-lírico, segundo o professor, estava triste, quando o seu limite era entender que aquilo era azul porque...sim!
Se eu fosse apostar em um dos benefícios do estudo da literatura para o ser humano seria o da possibilidade de abstrair da realidade objetiva novas realidades, e isso pode ser usado em qualquer área da vida, inclusive, para você alcançar o seu grande sonho de Game Dev. #correprapegarumlivro 🤓🤓🤓🤓
Uma das minhas ambições como Game Dev é criar um game pra fazer o Alanzoka chorar. Quero players olhando pro teclado e repensando a vida. Mas até hoje quem mais chora sou eu... de raiva... quando perco meus arquivos.
O que Fernando Pessoa fala nos versos acima é uma mensagem para você, Game Dev, que quer evocar algum tipo de emoção no jogador e fazer seu enredo funcionar: você tem que saber como é a emoção para fingi-la na hora certa. O ato de fingir, aqui, seria o de acessar no seu banco de dados emocional essa sensação e transcrever isso naquele roteiro que você criou através dos elementos que você tem em mãos.
A criação de uma atmosfera envolvente não é aleatória, é pensada. O game é um texto e tudo num texto deve ser pensado. Uma cena dramática não deve se resumir a um corte no pescoço de alguém que estava ali parado e um escândalo de alguém que testemunhou. A força disso está nos elementos que acompanham, como uma aura, essa situação como: quem são as pessoas envolvidas, a razão pro fato ter acontecido, efeitos sonoros e visuais escolhidos para intensificar no jogador a sensação de urgência, de impotência e empatia.
Cruel? Não!
Posso citar algumas experiências. Meu projeto, Okanobi, tem como protagonista uma criança. O jogo todo foi elaborado para tentar criar entre jogador e Kardias algum vínculo. Alguns beta testers retornaram que, em determinados momentos em que Kardias passa por situações bruscas (como na fase do limbo), sentiram pena e vontade de protegê-lo. Além de alguns que criaram ódio de uma certa personagem por considerá-la o mal encarnado. Se Kardias fosse um homem adulto passando por isso a recepção muito provavelmente seria outra.
Uma outra experiência foi a primeira vez em que joguei O Horror Amarelo, do Omar Zaldivar (que inclusive tá aqui no site para download). Eu senti o aperto que Ângela sente, houve esse fator empático, principalmente por eu já ter passado por algo semelhante (não... nada Lovecraftiano, mas lembranças paralisia do sono foram engatilhadas na hora).
Encontre a sua maneira de evocar sentimentos e sensações armazenados na sua memória emocional, seja por música (minha preferida), exercícios mentais com imagens (podemos falar disso depois), filmes e...outros jogos...
E...
Observe... observe muito! OBSERVE TUDO!
Observe e reflita sobre o porquê daquele zoom na criança chorando enquanto o Titanic afunda, o porquê da mulher de salto alto correr escadas acima perseguida por zumbis em Resident Evil 2 (e um slowmotion dramático do salto quebrando).
Observe as relações entre as pessoas e as diferentes manifestações (de preferência sem julgamento algum). Leia relatos sobre situações semelhantes a que você quer retratar. Experimente efeitos sonoros e visuais (leia sobre como as cores influenciam a mente) e trabalhe o timing de como tudo ocorre (jogo com jumpscare na veia não garante um terror marcante, ok?).
Uau! Você está com tudo hoje hein! Ótimo texto, estou ansioso para ver tudo que está por vir aqui no fórum! Obrigado Mister!